Abordagem terapêutica da Fibromialgia
Para que haja sucesso no tratamento da Fibromialgia, é fundamental estabelecer uma relação de confiança com o paciente, na qual ele tenha a certeza e a segurança de que seu médico realmente acredita e se preocupa com seus sintomas.
O primeiro passo do tratamento consiste em educar e informar o paciente sobre sua doença, assegurando-lhe de que seus sintomas são reais e enfatizando a natureza benigna da síndrome.
Deixamos claro que a Fibromialgia não será curada, mas os sintomas poderão ser controlados, proporcionando alívio suficiente para melhorar sua qualidade de vida e sua atividade funcional.
Ao longo do tratamento, ele aprenderá a reconhecer as origens dos sintomas, como manipulá-los e controlá-los.
É importante esclarecer que o tratamento depende basicamente do indivíduo, e, por isso, procuramos fazer com que ele assuma uma atitude positiva diante das propostas terapêuticas. Como estamos lidando com uma doença crônica, faz-se necessário estabelecer objetivos realistas e dividi-los em curto, médio e longo prazos.
Certamente, a atividade física é uma das principais medidas terapêuticas. Todos os pacientes devem ser encorajados à sua prática diária e a evitar o repouso como tratamento da Dor Muscular.
Vários trabalhos demonstram uma melhora global e do quadro doloroso nesses pacientes de maneira persistente ao longo do tempo. Tal resultado ocorre por um efeito analgésico (estimulação da liberação de endorfinas), antidepressivo, e por proporcionar uma sensação de bem-estar global e de autocontrole.
A atividade física deve ser bem dosada para que não seja muito extenuante. Seu início deve ser leve, e a sua “intensidade”, aumentada de forma gradativa. Precisa ser bem planejada, de modo a ser tolerada desde o início e para manter a aderência do paciente por um período prolongado.
Em princípio, qualquer atividade física aeróbica e de baixo impacto (como natação, caminhada ou hidroginástica) é a mais recomendada, deixando a escolha, se possível, ao paciente.
Em geral, uma caminhada no passo normal do paciente, durante 30 minutos diários, proporciona efeitos terapêuticos encorajadores. Em alguns casos, essa atividade torna-se a única terapêutica necessária.
Como uma porcentagem entre 25% e 50% desses pacientes apresenta distúrbios psiquiátricos concomitantes – que dificultam sua abordagem e melhora clínicas –, faz-se necessário, muitas vezes, um suporte psiquiátrico e psicológico profissional.
Técnicas específicas, como a terapia cognitivo-comportamental, devem, em minha opinião, ser utilizadas para aumentar a adesão do paciente ao tratamento, pois conseguem, em um curto espaço de tempo, alterar seus hábitos, de modo a torná-los úteis para um melhor controle de seus sintomas, dando-lhes ânimo para prosseguir no tratamento.
Em geral, a utilização de medicamentos na Fibromialgia tem como principal objetivo o controle da dor e, quando possível, dos demais sintomas.
No entanto, os fármacos devem ser utilizados com muita parcimônia, pois tais doentes apresentam uma sensibilidade maior aos seus efeitos colaterais.
As drogas mais utilizadas e estudadas são os agentes tricíclicos ciclobenzaprina e amitriptilina.
Esses agentes inibem de forma não específica a recaptação periférica da serotonina e da noradrenalina, potencializando o efeito de ambos os neurotransmissores e influenciando as vias descendentes inibitórias que modulam a transmissão nociceptiva da dor.
A ciclobenzaprina, embora seja um agente tricíclico com estrutura similar à da amitriptilina, é uma droga que não apresenta efeitos antidepressivos, sendo utilizada como miorrelaxante, ação derivada provavelmente da sua habilidade em modular a tensão muscular ao nível supra-espinhal, através da redução da atividade do neurônio motor eferente, sendo utilizada em doses de 5 a 40 mg/dia, 2 a 4 horas antes de deitar.
A amitriptilina, por sua vez, é empregada geralmente em doses de 12,5 a 50 mg, 2 a 4 horas antes de deitar. Doses maiores de amitriptilina em geral não são bem toleradas pelos pacientes.
Essas drogas, além de aliviar a dor, demonstraram melhora na fadiga e particularmente no sono de pacientes com Fibromialgia. A noritriptilina, também um derivado tricíclico, é o metabólito ativo da amitriptilina e apresenta uma grande especificidade para inibir a recaptação de noradrenalina, bem como uma incidência menor de efeitos colaterais, em especial os colinérgicos. Alguns pacientes que não toleram o uso de amitriptilina ou ciclobenzaprina podem utilizar doses que variam de 10 mg a 25 mg e obter algum efeito benéfico.
Os bloqueadores seletivos de recaptação de serotonina, em particular a fluoxetina, quando usados de maneira isolada, não demonstram um efeito importante no controle da dor.
No entanto, a fluoxetina associada à ciclobenzaprina ou à amitriptilina amplifica o efeito analgésico de tais drogas.
Esse grupo de antidepressivos, associados ou não a doses pequenas de tricíclicos, constitui uma boa opção nos quadros em que há Depressão.
A venlafaxina e a duloxetina, bloqueadores seletivos de recaptação de serotonina e noradrenalina, mostraram efetividade no tratamento da dor independentemente dos seus efeitos antidepressivos.
Ambas podem ser empregadas em pacientes cujo quadro doloroso tenha ou não associação com a Depressão.
A venlafaxina, particularmente, parece melhorar também a Fadiga, sendo utilizada em doses de 37,5 mg a 150 mg. A duloxetina, por sua vez, é utilizada em doses diárias de 30 mg a 120 mg.
Alguns estudos demonstraram que o tramadol isolado ou associado ao acetominofeno é eficaz no controle da dor e bem tolerado pelos pacientes, sendo uma boa opção nas exacerbações dolorosas ou nos casos de difícil controle da sintomatologia dolorosa.
Deve-se ter cautela quando for utilizado em conjunto com outros antidepressivos, pois aumenta os riscos de convulsões.
A maioria dos benzodiazepínicos não deve ser empregada nos pacientes com Fibromialgia, pois altera a estrutura do sono e diminui a duração do sono profundo.
O alprazolam, no entanto, demonstrou em vários estudos, eficácia nas doses entre 0,5 mg a 3 mg na terapêutica da Fibromialgia, tanto sobre o sono como sobre os sintomas dolorosos, sendo também uma opção para aqueles pacientes que apresentam quadro ansioso importante.
Nos pacientes com dificuldade em iniciar ou manter o sono, podemos utilizar o zopiclone (7,5 mg) ou o zolpidem (5 mg a 15 mg), compostos hipnóticos não-benzodiazepínicos, indutores do sono.
Devem ser utilizados com muita cautela por criarem tolerância e possível dependência e serem prescritos por curtos períodos de tempo, apenas como reguladores iniciais do sono.
O uso de anticonvulsivantes na Fibromialgia, baseia-se na capacidade dessas drogas aumentarem o limiar de despolarização das vias nociceptivas aferentes, diminuindo a transmissão do impulso doloroso ascendente.
A gabapentina, um agente anticonvulsivante, apresenta propriedades analgésicas quando utilizada em altas doses diárias (por volta de 2.000 mg).
O uso de antiinflamatórios hormonais (corticosteróides) ou não-hormonais não apresenta efetividade no tratamento da Fibromialgia. Estes podem ser empregados em comorbidades dolorosas, que atuam como fatores geradores periféricos de dor.
O tratamento farmacológico isolado é pouco eficaz (apenas 30% a 40% dos pacientes melhoram).
Além disso, os efeitos colaterais adversos desses medicamentos (como boca seca, constipação, retenção de líquidos, aumento de peso e dificuldade de concentração), mesmo quando utilizam-se doses baixas, são importantes na falta de complacência dos pacientes.
Assim, o tratamento multidisciplinar é obrigatório, e cada aspecto do paciente deve ser individualizado com o objetivo de fazer um adequado planejamento terapêutico.
Essa equipe multidisciplinar deve ser integrada, com a participação, além do reumatologista, de médicos de outras especialidades, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais e psicólogos.
Leitura recomendada
Barkhuizen A. Pharmacologic treatment of fibromyalgia. Current Pain and Headache Reports 2001; 5: 351-358.
Cohen SP, Mullings R, Abdi,S, Warltier DC. The pharmacologic treatment of muscle pain. Anesthesiology 2004 ; 101: 495-526.
Crofford LJ. Pharmaceutical treatment options for fibromyalgia. Current Rheumatology Reports 2004; 6: 274-280.
Littlejohn GO. Editorial balanced treatments for fibromyalgia. Arthritis & Rheumatism 2004; 50: 2725-2729.
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