SOROCABA / SP - quinta-feira, 22 de maio de 2025

CICLO SONO-VIGÍLIA É UM RITMO CIRCADIANO

CICLO SONO-VIGÍLIA É UM RITMO CIRCADIANO

 

O ciclo sono-vigília é um ritmo circadiano, isto é, em condições naturais este ritmo apresenta sincronização com fatores ambientais e oscila com um período de 24 horas.

 

A alternância do dia-noite (claro-escuro), os horários escolares, os horários de trabalho, horários de lazer, as atividades familiares, todos são fatores exógenos que sincronizam o ciclo sono-vigília.

 

Além dessa sincronização ambiental, o ciclo sono-vigília é gerado e regulado endogenamente por uma estrutura neural localizada no hipotálamo que é o núcleo supra-quiasmático (NSQ), considerado o relógio biológico para os mamíferos (Aschoff, 1979).

 

Há uma relação temporal entre o ciclo sono-vigília e outros ritmos biológicos no próprio organismo como, por exemplo, a melatonina, o hormônio de crescimento, o cortisol, e outros (Goichot et al., 1998).

 

Esta relação de fase entre os ritmos endógenos é conhecida como ordem temporal interna.

 

Há uma série de evidências apontando para o fato de que a sincronização com o meio ambiente e a ordem temporal interna representem uma necessidade para a expressão fisiológica e comportamental normal de um organismo.

A perturbação tanto da ordem temporal interna quanto da externa pode levar

a problemas de saúde (Moore-Ede & Richardson, 1985).

O equilíbrio entre as influências dos sincronizadores e a ordem temporal interna pode ser perturbado por mudanças abruptas em jornadas de trabalho, vôos trans-meridianos ou trabalho noturno (Monk, Buysse, Bibly, Kennedy & Wilbrich, 1998). Isto pode desencadear uma série de perturbações como transtornos do sono, sensação de mal-estar, alterações gastro-intestinais, flutuações no humor (irritabilidade, tensão, confusão, ansiedade) e reduções no desempenho em tarefas que requerem atenção e concentração (Gaspar, Moreno & Menna-Barreto, 1998).

Os estudantes, normalmente, apresentam um padrão de sono irregular caracterizado por atrasos de início e final do sono dos dias de semana para os finais de semana, curta duração de sono nos dias de semana e longa duração de sono nos finais de semana.

 

O sono prolongado nos finais de semana é devido à redução do sono (privação) durante os dias de aulas ou de trabalho. O atraso na hora de deitar nos finais de semana parece estar associado à tendência do sistema de temporização circadiana de provocar atrasos na fase do início do sono (Valdez, Ramírez & Garcia, 1996).

 

Trabalho realizado no Laboratório de Cronobiologia (UFRN) demonstrou que estudantes que iniciavam suas aulas às 7h, apresentavam privação parcial do sono e irregularidade do sono decorrente dos horários escolares e das demandas acadêmicas.

Como conseqüência desta irregularidade, estes estudantes apresentavam qualidade de sono ruim e baixo desempenho acadêmico (Medeiros, Mendes, Lima & Araújo, 2001). Em um estudo epidemiológico, Gianotti (1997) relatou que estudantes italianos dormiam menos durante a semana, queixavam-se mais de sonolência diurna e cochilavam mais freqüentemente que a população em geral, e que, em decorrência destes fatores, havia uma associação com baixo desempenho acadêmico, com sintomas de ansiedade e depressão e maior uso de tabaco, álcool e cafeína.

Em condições naturais, os seres humanos precisam de certa regularidade no seu padrão do ciclo sono-vigília, porém, para os estudantes universitários, existem dois grupos de fatores que agem de forma antagônica no processo de

sincronização do ciclo sono-vigília: o ciclo claro-escuro e os fatores endógenos (necessidade de sono e as preferências quanto à alocação do horário de dormir e de acordar – cronotipo), que tendem a sincronizar o ciclo sono-vigília em um ritmo regular e com período de 24 horas e, por outro lado, as demandas acadêmicas que tendem a reduzir o sono e os horários escolares que tendem a sincronizar o ciclo sonovigília com um padrão diferente do ciclo claro-escuro. Esta oposição entre estes dois fatores pode ser considerada como uma situação de conflito, em que os estudantes precisam decidir entre manter a regularidade do ciclo sono-vigília e satisfazer as necessidades de sono, e responder aos esquemas escolares e as demandas acadêmicas, podendo provocar alterações no estado afetivo.

Algumas evidências experimentais (Sadeh & Gruber, 1997; Uhde, 1998; Valldeoriola & Molinuevo, 1999; Yamashita, 1997) apontam para uma interação entre o sono e o comportamento emocional e, mais precisamente, entre o sono e a ansiedade.

A ansiedade é um sinal de alerta determinado pela presença de um conflito interno, que tem a função de avisar sobre um perigo iminente, possibilitando que a pessoa tome medidas para lidar com a ameaça (Holmes, 1997).

 

É provável que todos tenham experimentado ansiedade em algum momento.

Dados demonstram que a ansiedade tem aumentado expressivamente

na população humana, incluindo a categoria dos estudantes universitários, por isso alguns autores têm chamado o século XX de “A Era da Ansiedade” (Twenge, 2000).

Desta forma, buscou-se mostrar evidências empíricas de uma relação entre o sono e a ansiedade, avaliando quanto a ansiedade pode ser um fator de labilidade do ser humano de organizar o ciclo sono-vigília em situações de conflitos temporais

A alteração do ciclo sono-vigília contribui para o desencadeamento de respostas ansiogênicas.

 

Referências

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